sexta-feira, 27 de novembro de 2009

«Portugal: Um Retrato Social»


Por Ana Pinto, Ângela Gago, Lénia Maria e Rúben Remédios

Portugal: Um Retrato Social é um documentário do sociólogo António Barreto, produzido e emitido pela RTP em 2007. A Redacção 2.3 tomou contacto com um dos sete episódios dessa obra «Igualdade e Conflito: As relações sociais», numa aula de Sociologia.

O autor da obra esclareceu que «este é o retrato do nosso país (…) que melhor se compreende se olharmos para o passado, para os últimos 30 ou 40 anos». No sexto episódio do documentário que decidimos analisar, são abordados temas como a relação entre a família e o trabalho, a cultura, os espectáculos e os media, as mudanças no comportamento sexual, entre outros. Ao longo da série, o telespectador vive «(…) entre 1960 e a actualidade, um longo período de desenvolvimento», tal como é referido por António Barreto num dos textos que acompanha o DVD, editados pelo Jornal Público.

Relação Família/Trabalho

Desde os últimos 40 anos até à actualidade, Portugal tem vindo a sofrer mudanças nas relações familiares. Nas décadas de 60-70 vivia-se, no nosso país, um ambiente de grande repressão, provocado pela Ditadura de António Oliveira Salazar. Este clima não favoreceu as relações familiares que eram baseadas em regras e princípios rígidos, o que fazia com que os filhos tivessem mais respeito pelos pais. Este cenário desapareceu e hoje em dia «a autoridade dos pais é frequentemente posta em causa. Parecem estar a perder perante a concorrência da escola, da rua, da discoteca, dos “grupos”, da política, da cultura e das igrejas».

Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, ambos os pais passaram a ter um papel activo na sociedade. Assiste-se a um afastamento da família «as refeições eram no passado, um momento em que toda a família se reunia. Deixaram de o ser», opina António Barreto.

Com a entrada da indústria em Portugal, notou-se uma diminuição das classes rurais em favor das classes operárias. No sector terciário, mais especificamente nos serviços e na administração, aumentaram as classes médias.

Actualmente as diferenças entre as classes sociais são mais subtis mas continuam a existir «vivem em bairros diferentes e as suas casas distinguem-se. Têm divertimentos próprios e a sua vida de todos os dias não se confunde», sublinha António Barreto. Porém «a sociedade de consumo dá a ilusão de que não existem diferenças», diz ainda o autor. O nível de vida entre os “ricos” e os “pobres”, pode-se confundir, pois quem não tem publicidade de usufruir de um bom carro, de uma boa casa, ou mesmo de viagens na altura das férias, pede emprestado a um banco e o problema “resolve-se”.Para a sociedade, a questão do endividamento reflecte um grave problema.

A Cultura, os Espectáculos e os Media

No tempo dos nossos pais e avós não havia certos luxos que temos hoje. Começando por bens tão indispensáveis como a electricidade, a água canalizada e o saneamento básico, nem a tecnologia dos objectos do quotidiano de hoje, como telemóveis, jogos de computador ou Playstation: “pequenos brinquedos” que a geração de hoje não consegue dispensar.

Hoje, a sociedade de “consumo de massas” está bem presente na vida de todos nós, basta ir a um centro comercial e deparamo-nos com pessoas a fazer compras, a ir ao cinema, a comer em diferentes restaurantes, de acordo com a preferência de cada um.

Os meios de comunicação de massas também chegam a casa das pessoas, através da televisão e dos jornais e revistas. A televisão tem um papel de destaque na vida da população «em média, cada português vê quatro horas de televisão por dia (…). As telenovelas são sobretudo para as mulheres, o futebol para os homens (…). Parecem ficar assim satisfeitas as aspirações culturais dos portugueses», segundo afirma o cronista.

«Ao contrário dos países europeus, a leitura em Portugal não é um fenómeno de cultura popular. Um português, em média, lê um livro por ano», esclarece o narrador do documentário. A população portuguesa lê somente aquilo que mais lhe interessa, respectivamente, as revistas “cor-de-rosa” para as mulheres e os jornais desportivos para os homens.

Nos restantes países da Europa a realidade não é a mesma, pois a população tem hábitos de leitura mais frequentes e diversificados. Nota-se também uma grande discrepância relativamente ao preço a que são vendidos os jornais e os livros entre Portugal e os demais países europeus.

Em relação aos espectáculos, em Portugal tiveram uma grande adesão. No início só existia o «Festival Vilar de Mouros», hoje em dia há mais variedade. São disso exemplo os festivais «Sudoeste», «Super Bock, Super Rock» e concertos de grandes concentrações de massas, como o «Rock in Rio».

Mudanças no Comportamento Sexual

Desde 1960 para cá a vida sexual dos portugueses tem vindo a sofrer mutações de grandes níveis. Antes não era aceite pela sociedade uma mulher que não fosse virgem para o casamento, mas o homem já podia casar sem o ser. «A sexualidade era dominada pelo machismo», como afirma António Barreto.

Um dos vários testemunhos presentes ao longo do documentário dá a sua opinião acerca deste tema na actualidade «O sexo deixou de ser uma fantasia, é uma coisa natural. Digamos que há muita procura e muita oferta, pode ser encontrado numa esquina, num bar, ou num filme no cinema em sexo explícito», opina Pedro Canais.

A vida à noite também mudou radicalmente. Se antes não havia a liberdade para saídas nocturnas, hoje o cenário inverte-se, de tal forma que há discotecas por todo o país, muitas delas não licenciadas, para faixas etárias desde os 13 anos. As drogas e o álcool começam a ser uma companhia, cada vez mais precoce, para muitos jovens. As razões são muitas, passam pelas formas de relacionamento dos jovens entre si e com as suas famílias, apresentando o documentário registos de jovens que confessam não ter visto os pais durante toda a semana. «Aos 14 e aos 15 anos é a idade onde tudo acontece. Hoje em dia há muita informação, só quem não quer é que não tem (…) e em relação aos pais, uns conseguem ajustar-se aos problemas, outros não. Uns conseguem adaptar-se ou pôr-se a par, outros não», testemunha Márcio Santos.

O documentário produzido em 2007 retrata grande parte do quotidiano de qualquer um. De 2007 para 2009 não houve mudanças muito significativas a nível social, mas houve a nível político e económico.

Na política, o Partido Socialista continua no poder do Governo, no entanto houve mudanças a nível autárquico em algumas freguesias. A crise económica está mais acentuada. Por todo o país começam a existir campanhas de como poupar mais, apelando aos portugueses que «apertem o cinto», agora mais do que nunca. «No documentário está bem representada a nossa actualidade. Talvez o que mudou mais tenha sido a insegurança. Em 2009, sinto que há mais insegurança e criminalidade junto dos bares», opina Pedro Silva, um aluno do curso de Ciências da Comunicação. «A crise económica tem vindo a aumentar, há falta de emprego e as pessoas não têm tantas facilidades económicas», acrescenta ainda Pedro Silva.

O documentário Portugal: Um Retrato Social «é um dos melhores documentários que a RTP e os canais portugueses emitiram», observa o Prof. Carlos Luz, docente de Sociologia, da Universidade do Algarve.